controle glicêmico (3)
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HEMOGLOBINÚRIA PAROXÍSTICA NOTURNA

Em condições normais, as células sanguíneas expressam na superfície a proteína glicosilfosfatidilinositol (GPI), que atua como âncora promovendo a ligação de outras proteínas à membrana celular. Dentre estas proteínas estão a DAF (CD55) e a MIRL (CD59), que conferem proteção contra a ação do complemento. Na hemoglobinúria paroxística noturna (HPN), uma mutação no gene da fosfatidilinositolglicana classe-A, localizado no cromossomo X da célula precursora hematopoiética, impede a produção da proteína âncora GPI, fazendo com que seja formado um clone de células (eritrócitos, leucócitos e plaquetas) suscetíveis à ação e destruição pelo complemento. A HPN pode também surgir em associação com outras doenças hematológicas, especialmente com síndromes de insuficiência medular, como anemia aplástica e síndromes mielodisplásicas.

HEMOGLOBINÚRIA PAROXÍSTICA NOTURNA

Assim, a hemólise na HPN resulta do aumento da susceptibilidade de eritrócitos clonais ao complemento, pela redução ou ausência completa das proteínas regulatórias na superfície celular. O sistema complemento consiste em mais de 40 proteínas séricas que interagem em sequências precisas de ativação enzimática e ligação à membrana celular, gerando produtos com propriedades imunoprotetoras, imunorregulatórias, pró-inflamatórias e citolíticas. Pode ser ativado por três vias: via clássica, via da lectina e via alternativa, sendo que as três resultam na geração de complexos C3-convertase, que mediam a quebra de C3 em C3a e C3b.

A ativação depende de uma cascata proteolítica caracterizada pela alta conservação dos sítios catalíticos de serina, histidina e aspartato. A ativação, por qualquer via, culmina em uma via terminal comum que leva à formação do Complexo de Ataque à Membrana (MAC), responsável pela lise osmótica da célula alvo.

HEMOGLOBINÚRIA PAROXÍSTICA NOTURNA
 Ativação do sistema complemento.

Células HPN são vulneráveis à ativação do complemento por qualquer das três vias; como a via alternativa mantém um estado de ativação baixa, porém contínua, isto explica porque os pacientes com HPN têm hemólise crônica contínua.

A hemólise crônica traz grande morbidade para os pacientes afetados. Ocorre letargia, astenia, mialgia difusa e perda da sensação de bem-estar, o que reduz significativamente a qualidade de vida. Durante os surtos de hemólise intravascular aguda, os chamados paroxismos, ocorre hemoglobinúria, notada por urina marrom-escura, que pode vir acompanhada de sintomas gastrointestinais, náuseas, icterícia, dor abdominal, disfagia, espasmo esofagiano e piora da astenia.

Existe ainda redução de função renal pelo depósito de hemossiderina no parênquima renal. Acredita-se que alterações no pH sanguíneo à noite, com ativação do complemento, sejam responsáveis pela referência da hemoglobinúria observada frequentemente no período noturno ou nas primeiras horas da manhã.

Ainda assim, a hemólise intravascular (responsável pela hemoglobinúria em alguns casos) e a pancitopenia continuam sendo as principais manifestações clínicas. A hemólise pode ser monitorada pelos níveis séricos da enzima desidrogenase láctica (DHL), liberada em situações de destruição de hemácias. Esta enzima está tipicamente aumentada em pacientes com HPN, podendo chegar a até 20 vezes o limite superior da normalidade durante paroxismos graves. A anemia pode variar de discreta a acentuada, geralmente com normocitose e normocromia, exceto quando há perda significativa de ferro pela urina, o que reduz os valores de VCM e HCM. Além disso, há anisocitose evidente e a contagem de reticulócitos encontra-se elevada, embora não seja proporcional ao grau de hemólise.

O diagnóstico pode ser confirmado por meio do teste de sensibilidade celular à lise pelo complemento em soro acidificado (teste de Ham) ou pela demonstração da ausência de expressão dos marcadores CD55 e CD59 por meio de citometria de fluxo.

Em conclusão, a Hemoglobinúria Paroxística Noturna é uma condição complexa que requer uma abordagem multidisciplinar para manejo eficaz. O diagnóstico precoce e a introdução de terapias específicas têm melhorado significativamente o prognóstico dos pacientes. No entanto, a monitorização contínua e o manejo das complicações, especialmente tromboses, são cruciais para otimizar os resultados a longo prazo. É importante que o analista saiba correlacionar os resultados dos exames intersetoriais com o quadro clínico do paciente, permitindo um diagnóstico preciso, detecção precoce e monitoramento eficaz do tratamento e identificação de complicações.

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Referências

Naoum, Flávio Augusto. Doenças que Alteram os Exames Hematológicos. 2. ed. Rio de Janeiro: Atheneu, 2017.

ARRUDA, Martha Mariana de Almeida Santos et al. Hemoglobinúria paroxística noturna: da fisiopatologia ao tratamento. Revista da Associação Médica Brasileira, v. 56, p. 214-221, 2010.